Kant sonhou com um mundo sem guerras... e nós ainda estamos brigando em threads do Twitter

O que Kant, a razão e o cosmopolitismo podem nos ensinar sobre como sobreviver ao século XXI (sem nos matarmos no processo).

Edú Saldaña

4/10/20255 min ler

Kant, o viajante imóvel

Immanuel Kant nunca saiu de sua cidade natal, mas isso não o impediu de pensar o mundo inteiro. Enquanto você ainda discute no Twitter com desconhecidos sobre política internacional sem saber onde fica a Lituânia, Kant já se perguntava no século XVIII: “E se toda a humanidade tivesse uma única história?”

Em plena era de guerras, colonialismo e egos com coroas, ele propôs uma ideia radical: uma história universal com sentido cosmopolita, onde as nações cooperem em vez de competir. Um sonho raro em um mundo onde ainda discutimos se os migrantes têm direito de existir. Idealista? Sim. Mas também urgente.

O plano secreto da natureza: Kant explicou nossa toxicidade em grupo antes mesmo dos grupos de WhatsApp da família existirem

Kant acreditava que a natureza tinha um plano oculto: que a razão se desenvolvesse completamente na espécie humana. Não em mim, não em você (desculpa), mas em todos nós como humanidade. Mas como a natureza não dá nenhum passo sem drama, sua ferramenta favorita para nos fazer evoluir é...

O conflito.

E aqui vem a primeira reviravolta filosófica: é a tensão entre nossa necessidade de viver em sociedade e nosso egoísmo que nos obriga a nos organizar. É aquele caso clássico em que o caos te obriga a amadurecer. Tipo quando morei com colegas de quarto: eu não queria aprender a lavar a louça, mas a biologia microbiana me obrigou.

Kant chamou isso de “sociabilidade insociável”: precisamos uns dos outros para sobreviver, mas é difícil nos suportarmos. Nos juntamos, sim, mas mais por interesse do que por amor ao próximo. Basicamente, evoluímos não porque somos bons companheiros de equipe, mas porque não temos outra escolha a não ser aprender a conviver sem jogar pratos uns nos outros.

O cosmopolitismo: uma utopia racional (ou uma loucura sensata)

Kant imaginou uma “confederação de nações” baseada em leis comuns, não em exércitos ou muros. Não se trata de eliminar a diversidade nem de forçar a unidade, mas de cooperar a partir da diferença.

A proposta dele incluía:
  • Um marco jurídico internacional: Um conjunto de leis compartilhadas para que nenhum Estado faça o que quiser em nome da soberania. Exemplo: Tribunais internacionais que julgam crimes de guerra… e que de fato executam as sentenças. Cof cof… Netanyahu. Cof cof… impunidade seletiva.

  • Respeito aos direitos humanos: Antes mesmo da ONU ou das declarações de direitos, Kant já falava de dignidade humana. Por exemplo, proibir a escravidão ou garantir asilo a quem foge de conflitos. E não, não basta exigir o uso de “elu/delu” na sua vaga “crystal-friendly”: a verdadeira inclusão incluiria libras, braile e parar de assumir que todos têm Wi-Fi… já chega de me pedir para compartilhar meu internet!

  • Interdependência econômica: Quando os países dependem uns dos outros para sobreviver, é menos provável que se matem. China e EUA? Rivais, mas não atiram (por enquanto) porque compartilham bilhões em comércio. Você romperia com um sócio só porque ele te irrita? Não. Você apenas aguenta… e sorri nas reuniões.

E pra quem pergunta por que deveríamos nos importar com isso se “só quero pagar minha viagem pra Europa”, eu digo o seguinte: Progresso sem ética é como ensinar o P. Diddy a trocar fraldas. É útil, mas não para os propósitos certos.

Ricky Gervais e Kant: separados na maternidade

Em uma entrevista, o comediante Gervais diz: “É um mito estranho dizer que ateus não têm nada pelo que viver. É exatamente o contrário. Não temos nada pelo que morrer. Temos tudo pelo que viver.”

Isso, meu caro leitor, é basicamente Kant: a liberdade implica responsabilidade moral. Na ausência de crenças religiosas, a responsabilidade de levar uma vida ética recai totalmente sobre o indivíduo, sem esperar recompensas ou castigos em uma vida após a morte. A liberdade traz consigo uma responsabilidade moral inerente. E se sabemos que algo está errado, não podemos simplesmente dizer “eu sou assim” e culpar o horóscopo ou Mercúrio retrógrado.

Se quiser refletir mais sobre filosofia com perguntas incômodas, sarcasmo brutal e verdades que doem, não perca o especial Humanity, de Ricky Gervais, na Netflix. É uma jornada brilhante e crua sobre a estupidez humana, o ego e o riso como espelho moral.

Nacionalismo extremo: como transformar orgulho em xenofobia em 3 passos (sem perceber)

O que Kant diria sobre o nacionalismo atual? Provavelmente algo assim: “O nacionalismo é como se cada órgão do corpo achasse que pode viver sem os outros. Spoiler: não pode.”

Num mundo onde a pandemia fechou fronteiras e migrantes ainda são criminalizados, a visão kantiana de uma cidadania global nunca foi tão atual. A paz não é ausência de guerra, e sim presença de justiça global.

Além disso, Kant entendia que o sentimento de pertencimento a uma nação não devia ser pretexto para negar direitos aos outros. O nacionalismo, quando vira exclusão, perde sua identidade e se transforma em ideologia perigosa. Em vez disso, Kant propunha um patriotismo racional: amar seu país, mas sem desprezar o resto do mundo.

Como passamos do orgulho nacional à xenofobia sem perceber?
  1. Confundir amor pelo seu país com ódio ao estrangeiro. Porque nada grita mais “Sou patriota!” do que querer deportar o cara que faz as melhores arepas do bairro.

  2. Achar que sua cultura é a única válida. Se alguém come com as mãos, dança estranho ou não assiste à Copa do Mundo, claramente é uma ameaça e nem é humano (Não é como se a Copa do Mundo fosse One Piece, porque se não assiste One Piece, você tem o direito de discriminar).

  3. Usar a palavra ‘identidade’ como desculpa pra discriminar. “Esse povo não é nosso”, você diz. Ah, é? Você nasceu da autofecundação do Hino Nacional ou também foi parido num hospital como todo mundo?

Aplicações práticas de Kant (mais úteis que seu app de meditação)

Kant não só filosofava no abstrato—ele acreditava que o pensamento deveria guiar a ação. Aqui vão algumas frases dele e como poderíamos usá-las hoje (sem precisar de doutorado em ética ou sessão de Ayahuasca):

  • “A liberdade é aquela faculdade que aumenta a utilidade de todas as outras faculdades.”
    Use sua liberdade para pensar, discordar e criar—não só para rolar o feed. Liberdade não é escolher entre duas marcas de iogurte no mercado; é ter senso crítico para não engolir qualquer ideologia com slogan patriótico.

  • “O sábio pode mudar de opinião. O tolo, nunca.”
    Mudar de ideia não é traição, é evolução. Se você muda de opinião, talvez não esteja traindo seus princípios… mas sim à sua teimosia ao nível de um tio bêbado no Natal..

  • “A educação é o desenvolvimento do homem até o grau de perfeição de que sua natureza é capaz.”
    Educar-se não é acumular diplomas, é aprender a viver com os outros. Se seu currículo é brilhante mas você não consegue ouvir sem interromper, Kant te dá um zero em humanidade.

A humanidade não é uma raça, nem uma bandeira. A pergunta é: podemos viver juntos sem nos destruir?

E você, o que acha? Kant foi um visionário à frente do tempo… ou só alguém que acreditava mais na gente do que a gente merecia?

Se isso te fez pensar, rir ou querer se mudar pra um mundo sem fronteiras, comente e compartilhe nas suas redes. E lembre-se: Kant nunca saiu da sua cidade, mas suas ideias chegaram mais longe que muitos passaportes.